
O reconhecimento de Somalilandia por Israel, a confirmar-se como acto formal, tem implicações que ultrapassam largamente o plano diplomático e projectam-se directamente sobre o shipping internacional.
Localizada na margem sul do estreito de Bab el-Mandeb, uma das passagens marítimas mais críticas do mundo, Somalilandia ocupa uma posição por onde circula entre 12% e 15% do comércio marítimo global, incluindo as principais rotas de contentores entre a Ásia e a Europa, fluxos energéticos do Golfo e tráfego de granéis estratégicos. A entrada de Israel neste espaço acrescenta um novo actor com capacidade tecnológica, de vigilância e de inteligência naval numa região já fortemente marcada por instabilidade, conflitos assimétricos e militarização crescente, em particular devido à situação no Iémen e aos ataques a navios mercantes registados no Mar Vermelho.
Do ponto de vista do shipping, isto não significa uma alteração imediata das rotas, mas introduz uma nova camada de leitura do risco, com impacto nos seguros marítimos, na gestão operacional das frotas e nas decisões comerciais dos armadores. Um dos pontos centrais deste movimento é o porto de Berbera, em Somalilandia, actualmente concessionado à DP World e em processo de modernização. O eventual envolvimento israelita poderá reforçar a dimensão estratégica desta infraestrutura, através de investimentos em segurança, tecnologia e monitorização, transformando um porto regional num activo logístico com peso geopolítico no Corno de África. Para o sector marítimo, Berbera deixa de ser apenas uma alternativa comercial e passa a integrar o mapa dos portos observados à luz da segurança das cadeias de abastecimento globais. No plano operacional, os efeitos mais imediatos deverão sentir-se de forma indirecta, nomeadamente na diferenciação dos prémios de seguro por bandeira, tipo de carga e armador, bem como na reavaliação de escalas, bunkering e gestão de risco político, sobretudo nos segmentos de contentores e energia.Em termos globais, este reconhecimento não estabiliza nem desestabiliza por si só o tráfego marítimo no Mar Vermelho, mas contribui para um equilíbrio ainda mais frágil num dos principais gargalos do comércio mundial.
A presença de mais um actor com capacidade de projecção estratégica pode aumentar a vigilância e a previsibilidade para alguns operadores, ao mesmo tempo que eleva o valor simbólico e militar da região, tornando-a potencial alvo em cenários de escalada. Para o shipping internacional, a mensagem é clara: o Bab el-Mandeb continuará a ser atravessado diariamente por milhares de navios, mas cada movimento geopolítico acrescenta custos, complexidade e incerteza a uma rota que, sendo vital, está longe de ser neutra.